a esperança

ando inquieto toda hora
estou aqui quero ir embora
um condenado com esperança
quem sabe meia hora do teu dia
um café, uma risada, a companhia
juro contentar com pouco
se me preparo pro desgosto
quem dirá, em mim, quanta alegria
com a alvorada de um sorriso no teu rosto

(Martins Filho)

pensamento sobre a humildade na medida certa

É essencial ser humilde, estar aberto a mudar ou aceitar novos rumos. Mas se você escuta demais as pessoas e esquece de ouvir a si mesmo, a pessoa que, em última análise, realmente interessa ou que mais será afetada de verdade, corre o risco de viver a vida que os outros querem. Sempre vai haver os que não gostam de você, mas existirão os que vão te respeitar, e se for ao ponto de inspirá-los de alguma forma, tal resultado será tão maior do que qualquer adversidade. Quando você toca as pessoas, é o sinal de que deve prosseguir. Viver aquilo que é verdadeiro pra você sem profanar aquilo que você crê: é assim que funciona.

(Martins Filho)

tem no amor

amar tem lá seus engodos
consciente na sua existência
do quanto é frágil estar ali
mas se for o caso, não desiste
na sua curta permanência
que se basta em si

amar tem lá seus prantos
e mesmo que a vida
por maldade ou implicância
lhe impute certa relutância
entrega àqueles que lhe incitam
a sua existência, sua relevância

(Martins Filho)

pensamento sobre ser pequeno

Não que eu deseje a tristeza, mas agente tende a ser mais humano - o que, convenhamos, faz um bem danado - quando nos sentimos em desalento... e tem uns dias em que eu me sinto tão pequeno, que meu coração mais parece uma partícula.

(Martins Filho)

esteja a vontade

Fique a vontade para sentir o que quiser quando ouvir meu nome. Sinta-se livre para rir da minha cara ou para chorar a minha falta quando ouvir a nossa música. Risque, se quiser, qualquer momento da memória, se você tiver coragem. A porta estará sempre aberta e não serei eu que terei a pachorra de evitar a lembrança do que fomos nós. Dos meus erros convictos, todos foram sinceros.

(Martins Filho)

pensamento sobre a posteridade

quando tudo que restou foi o vazio de não ter vivido como sonhara, vai olhar no espelho e lamentar aquelas lágrimas, perguntando o porquê de uma vida de tantas rugas tolas? Fez sentido não nos falarmos tantas vezes, mesmo que por poucas horas, só porque durou a raiva? E se for tarde demais para arrependimentos, para dar o braço a torcer e para admitir que daríamos tudo que temos, só prá ter de volta justamente aquelas poucas horas que foram desprezadas e aí sim, ter amor até o fim? E se realmente restaase pouco tempo, você não largaria tudo agora mesmo e sairia correndo prá abraçar com um sorriso nos olhos àqueles a quem você ama, tão forte como se fosse pela última vez? nesse caso, você veria o que eu estou vendo agora...

um trejeito

até te encontrar
um silêncio teimoso
que não se cala
um silêncio pomposo
que todos vêem
que vem da alma

sou um predestinado
a ter preso no peito
um amor exilado
tanto que dói
que essa dor não acalma
e é quase um trejeito

(Martins Filho)

pensamento sobre saudade

Agente diz que é saudade aqueles pedaços nossos que vão ficando no caminho. Agente diz que é amor se há alguém preocupado em recolhê-los, devolvendo embrulhados num lacinho.

(Martins Filho)

a vida?

a vida?
não tem frescura
há de se viver
simples assim
e pronto

de forma rara
de forma clara
tanto faz
mas há de ser vivida
e ponto

faltam-me palavras
se um sujeito
está na lida
e ignora
essa loucura

haja exclamação!
mas com ternura

(Martins Filho)

sem fim

queria que fosse assim
sem fim
mas quem disse
que eu que escolho

contento
assim de canto
me conformo contentar
até num pranto

nem choro
e se tenho choro
triste não fico mais
nem mais me espanto

(Martins Filho)

fosse hoje

fosse hoje
morreria saciado
pois, mais que outros
amei simplesmente
e chorei, tão carente
tudo que pude

eu achava direito
limitar ao meu peito
por onde ele iria
só que aí percebia:
amei mesmo além
além do que pude

mas não arrependo
mesmo morrendo
considero um defeito
quem não vive sofrendo
por aí, se perdendo
numa vida que ilude

(Martins Filho)

agua gelada

acordo cansado
a contra gosto clareado
por um sol que madruga
tento fechar os olhos
tento conter a ruga 
é que vou deitar tarde
as vezes nem vou, na verdade
fico esperando o nada
da noite até a alvorada
que espera aguda! 
se quiçá adormeço
o sonho tanto viaja
que dele esqueço
o corpo fez pirueta
ou faz nada?
tanto faz
mas quando lavo a cara
de tão cansado
nem lembro da estrada 
o dia lá fora? esquece...
e em frente a pia
agua gelada, agua tardia
noites inteiras
distante do amor
apegado às olheiras 
perde a hora
só que o dia ainda exige
com peito estufado
café já tomado
e por mais que se exiba
vagou pela noite
continua fadado
à necas de pitibiriba

(Martins Filho)

quero bem

ando aqui
e acolá
querendo-te
e ter-te
queria agora
quero já

quero além
zero à dez
quero cem
pois preciso
quero tanto
que quero bem

as mazelas do amor

quando escrevo
seja verso, seja poema
texto com rima
pra fazer graça
pra morena que passa
ou textinho
de qualidade pequena
pra esta mesma morena
finjo completamente
não ser um poeta
estar indiferente
e conter tanta dor
mas no meu fingimento
de uma alma inquieta
aí que eu aprendo
apesar, e não querendo
das mazelas do amor

chovia cansado

cansei da amizade
e da companhia
de uma caixa de lenços
que a vida jurou lealdade
ou de secar o meu choro
nas aguas da pia

cansei, na verdade
dessa pressa tardia
e daquelas tardes
onde eu olhava a alegria
pela janela do quarto
enquanto chovia

o ocupado

ando meio intenso
cheio desse vazio
ainda ontem foi desses dias
que de tão triste
não me coube ir lá fora
mas não creio da vida
fugir, ir embora
se meu passado
não fui eu que vivi
(pois estava ocupado)
que será deste eu
em que vivo agora?

a saudade

a saudade
quando bate a nossa porta
ou quando fica por perto
em silêncio, mas em alerta
se fingindo de esquecida
não se mingua por completo
ela volta bem mais forte
numa volta dolorida

de rua em rua

quem me dera
ser um rouco
por ter gritado
de rua em rua
a me exibir
com essa agonia
da tua falta
da minha procura...
que esse martírio
faça com a timidez
a cortesia
de ela ser mais louca 
e de ficar nua

caneta em riste

não sou poeta
eu só tenho alma
e a dita cuja
não se aquieta
às vezes triste
a folha atenta
caneta em riste
e a cada linha
da minha escrita
tem uma pergunta
essa questão  não resolvida:
por que agente
(não digo sempre)
não é da vida
feliz aos poucos
ou o suficiente?

um menino

talvez eu seja um menino
inocente eu insisto
todo dia num caminho todo meu
até ensaio um norte diferente
quase um Dom Quixote moderninho
mas sem vento, sem moinho
carregando um dó urgente
sem alguém sentado ao lado
que diga, devagarinho,
(a mão no ombro, o olhar devotado)
- “calma, é da vida que isso passe...
toda angústia tem algo quase belo:
a rosa frágil não escapa ao espinho;
e até o melhor prego tolera
a agressão do seu martelo..."

tons pastéis

pode ser de algum perigo
ao fotografar a própria vida
ver um retrato em tom pastel
ďuma vida sem contrastes
de um colorido desbotado
das rugas, do sorriso envelhecido
numa biografia amarelada
não pela idade decorrida
mas pelo querer já esquecido
e abandonado na metade